quarta-feira, 16 de novembro de 2016

escrevo

escrevo para doar sangue.
escrevo por ser imprudente.
escrevo pois quero ter filhos.
escrevo para tomar consciência.
escrevo pela simetria e pelo caos.
escrevo para continuar respirando.
escrevo pois alguém precisa fazê-lo.
escrevo quando desprezo o que existe.
escrevo quando penso no que não existe.
escrevo para ter algum controle sobre mim.
escrevo porque não tenho controle sobre mim.
escrevo porque aprendi sozinha a me manter viva.
escrevo porque nunca soube como fazer outra coisa.
escrevo para que o tempo passe e também para que pare.
escrevo pois tudo passa e nada para, e eu não me conformo.
escrevo porque conheço Navegantes Bandeirantes Diplomatas.
escrevo porque tenho uma péssima memória e um grande apego.
escrevo porque meu avô me levava de bicicleta até o jardim de infância.
escrevo pois às vezes tenho medos demais e noutras não tenho medo algum.
escrevo por duvidar que eu possuía alma até o dia que naveguei no São Francisco.
escrevo pois é quando escrevo que me entendo, e só me entendendo consigo escrever.
escrevo porque toco e ouço, leio e ouço, falo e ouço, vejo e ouço, pinto e ouço, ouço e ouço.
escrevo pra saber que existo quando sento no chão do banheiro esperando o remédio fazer efeito.
escrevo pois sempre soube que a sanidade é um fino fio que pode a qualquer momento arrebentar.
quando não escrevo, a nuca formiga, a respiração desregula, as cores e os sons se misturam, os pensamentos não têm ordem e a loucura parece estar batendo na minha porta, mas assim que as palavras tomam forma no papel, é como se os profetas, disfarçados de amigos numa roda de conversa ou de estranhos que acabei de conhecer no bar enquanto me desesperava por miudezas, estivessem certos quando disseram que tudo ficaria bem. escrevo por mim, por eles e por todos os outros. escrevo porque sei, porque não sei e porque quero saber. escrevo porque escrever não é opcional.

Um comentário:

  1. A libélula das repetições, o fogão das repetições, o arame farpado das repetições, o Vasco das repetições, a mitocôndria das repetições.

    P.S.: Li "a nuca formiga" em dois sentidos e sorri... Minha bobice tem limites?

    ResponderExcluir